Encontro marcado em Samarra

Encontro marcado em Samarra (extraído do livro You Only Live Twice, do Ian Fleming)
Reza a lenda que um sujeito muito rico mandou seu funcionário ao mercado fazer compras. Andava o sujeito pelo mercado quando se deparou com a Morte, e ambos se encararam, assustados. O funcionário correu de volta à casa e disse ao patrão:
“Senhor, encontrei a Morte no mercado e ela me olhou fixamente. Por favor, me empreste seu cavalo mais veloz para que eu possa chegar antes do anoitecer em Samarra, para me esconder na casa do meu irmão”.
E assim foi feito.
Chateado porque o empregado não trouxera as compras, o patrão resolveu ele mesmo ir ao mercado. Lá procurou pela Morte, e interpelou-a dizendo:
“Por que foste assustar meu funcionário, Morte?”
E a Morte:
“mas quem se assustou fui eu ao vê-lo aqui neste mercado, porque tenho um encontro marcado com ele em Samarra hoje à noite”.
Para sorte dos pilotos que correram hoje na Áustria, nenhum deles tinha seu nome anotado na agenda da Morte.
Logo depois do warm-up conversei com meu filho e apostei nas Suzukis, emboladas com Dovizioso. Miller seguiu o Dovi em boa parte do warm-up e enquanto o primeiro pilota todo torto, jogando a traseira para todos os lados, o Dovi parece estar em um fenda de autorama: tudo redondinho. Era inevitável que tivesse mais borracha que o australiano. As Suzukis estavam ainda melhores, e o Pol Espargaró continuava na fixação de fazer o melhor tempo, saindo da pista 3 vezes. Eu sabia que ele não venceria e apostava no Miguel Oliveira como melhor KTM.
Nenhum dos dois chegou ao final da corrida e é risível a hipocrisia do Pol, que, mais uma vez, perdeu uma freada, foi desta vez além dos limites da pista, e voltou sem olhar, pegando o Miguel na saída de curva. Como são do mesmo time, virou “acidente de corrida”, mas quem viu o português chegar ao boxe chutando as paredes sabe que não foi bem assim.
Esse negócio de ficar procurando culpados é como pênalti de jogo de futebol: quem torce para A acha uma coisa, quem torce para B acha outra. Em retas muito velozes o vácuo é traiçoeiro. Em Phillip Island 2018, o Zarco atropelou o Marquez no fim da reta. Foi puxado pelo vácuo. Hoje o Zarco ultrapassou o Morbidelli e buscou a linha de dentro da freada e o Morbidelli foi puxado pelo vácuo. Tem gente que acha que o mesmo Zarco foi culpado nos dois acidentes. Eu acho que foram incidentes de corrida. Não há dúvidas de que o Zarco é agressivo desde sempre, mas ele não bateu no Morbidelli, estava compeltamente na frente quando o acidente aconteceu. Alguns trazem o incidente de Brno, mas eu, e muita gente que pilota, acha que o Pol foi tão culpado quanto. E hoje repetiu a manobra duas vezes a primeira na curva um, voltando pra cima da Suzuki do Mir. Na segunda acabou com a corrida do Oliveira.

Ninguém pilota pra cair ou derrubar, mas acontece. Hoje mesmo, tanto na curva um quanto na três, foram inúmeras esfregadas de carenagem, inclusive com fogo amigo, Mir-Rins, Viñales-Quartararo. Na Moto3 o McPhee tocou com sua roda dianteira na traseira do Vietti por causa do vácuo e felizmente nenhum dos dois caiu. Não vamos nos enganar, esses sujeitos são os gladiadores dos tempos atuais e a Morte vai a todos os circuitos. Felizmente apenas para assistir, na grande maioria da vezes.
Dovi ganhou, correndo o mais devagar possível, como sempre. A primeira vitória desde o GP da Áustria do ano passado. O amor entre ele e Ducati acabou e ele confirmou isso na entrevista pós-pódio. Quando perguntado se havia alguma chance de reconciliação, ele foi curto e grosso: “NÃO!”.
Mir e Miller completaram o pódio e eu tenho a impressão que as Suzukis sumiriam na frente se conseguissem ultrapassar as Ducatis na curva 6 e botar um bom espaço antes da reta de chegada. No mais, é o que se viu: motores Ducati e KTM esculachando na covardia.
Binder e Rossi correram bem, mas foram beneficiados por 3 quedas à sua frente. Viñales aparentemente teve problemas na embreagem, que patinava, e Quartararo se queixou dos freios: fez um P8, atrás de Nakagami e Petrucci. O francês deu até sorte, pois não iria marcar nenhum ponto. Os freios foram trocados antes da segunda largada e ele lucrou 8 pontos.
Na Moto2 a primeira vitória do Jorge Martin, que é um fora-de-série. Está se acertando com a moto e vai ganhar outras. Marini e Schrotter fizeram o pódio, com Lowes em 4º pela terceira vez este ano. O resto aconteceu sem emoção, tirando o lamentável acidente do Syharin atropelando a moto do Bastianini, o que causou uma bandeira vermelha. Remy Gardner caiu, mais uma vez, desperdiçando a pole position.
Na Moto3 o Albert Arenas está dando um show de estratégia e tem 3 vitórias e um segundo lugar em 5 provas (na de Andaluzia tomou um tombaço). Já abriu 28 pontos do McPhee, 30 do Ogura e 45 do Suzuki. Tem tudo pra ser campeão.
Já aconteceu mais coisas neste ano do que nos últimos 5 anos de MotoGP. O grid está muito competitivo e teremos uma ou outra fábrica favorita dependendo das características da pista. Semana que vem teremos de novo Ducatis, KTMs e Suzukis com mais probabilidades de vencer. Em Misano as Yamahas voltarão com força. E, talvez, o Marc Márquez.
Esse grid deveria ter 24 motos, portanto há vaga para mais uma equipe. Urge que o Ezpeleta aperte a Suzuki para que apoie uma equipe satélite. E dê uma moto oficial pro Dovi.
No mais, entre mortos e feridos salvaram-se todos. Até domingo.

Pai orgulhoso do João e da Nanda, botafoguense, motociclista e cabalista. 15 anos como CIO e membro do Board de empresas multinacionais, participando no desenho e implantação de processos de logística, marketing, vendas e relacionamento com clientes e canais de vendas, inclusive por dispositivos móveis; Morador em Londres, é Fluente em Inglês e Espanhol, com conhecimentos avançados (leitura) e intermediário de Francês e Italiano; Possui cidadanias brasileira e francesa.

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