Foi uma maldade sem tamanho o que aconteceu com o Quartararo na 12a volta do GP da Inglaterra: traído pelo dispositivo de abaixar a suspensão traseira quando tinha 4.5 segundos de vantagem sobre o Bezzecchi. O francês está pilotando como nunca, tirando o máximo de sua Yamaha. Três poles consecutivas em pistas de características diferentes. Conseguiu andar na frente do pelotão, o que lhe permitia fazer as linhas perfeitas, aproveitando a melhor velocidade da moto japonesa no meio das curvas. E acabou zerado. Uma trapaça do destino.
Quem me acompanha já me viu escrevendo que há vitórias e vitórias. Não vou tirar o mérito do conjunto Aprilia/Bez, que já tinha feito uma corridaça na Sprint, recuperando-se da má largada que o deixou em 19° para chegar em 4°, rodando no ritmo dos Alex Marquez. Só que, pela segunda corrida consecutiva, me parece que os roteiristas do MotoGP se reuniram para discutir como poderiam adicionar drama ao espetáculo de forma a resultar em mais uma prova épica.
A Aprilia esteve nas manchetes por duas semanas porque os advogados do Jorge Martin quiseram mudar uma cláusula do contrato que o permitiria romper o contrato ao final do ano, caso ele não estivesse entre os cinco primeiros até o GP de Le Mans. Eles pretendiam estender essa cláusula para o sexto GP após a volta do espanhol, contando-se apenas os pontos das corridas que ele disputasse. Aparentemente, uma proposta justa, só que os mesmos advogados fizeram valer, em 2020, a data estabelecida no contrato que o Martinator tinha com a KTM, que dava como junho de 2020 a data de corte que o livraria do compromisso com a marca austríaca. O fato é que o campeonato só começou no dia 17 de julho, mas eles foram inflexíveis e o espanhol assinou com a Ducati. A Aprilia, agora, se sentiu no direito de também ser inflexível: afinal, a principal causa da ausência do Martin em 2025 foi um tombo que ele levou em um treinamento privado de supermoto antes do GP de abertura. Não obstante, a fábrica de Noale, mesmo privada do seu maior investimento, lhe deu todo o apoio. O clima azedou entre piloto e equipe e a vitória em Silverstone é o ápice desta situação de suspense. E agora, Jorge?
Não sou fã do Bezzecchi, nem acho que a Aprilia tenha encontrado a fórmula mágica. Eles têm um conjunto motor/chassi que casa perfeitamente com a pista inglesa. Aleix venceu em 2023 e foi pole ano passado. Junte-se a isso os seguintes fatos:
1) as GP25 destruíram os pneus dianteiros macios na Sprint
2) a temperatura caiu muito de sábado pra domingo e quem optou pelo pneu dianteiro médio teve dificuldades
3) Alex Marquez, o grande favorito, se estabacou na 1a largada e correu com a moto reserva
4) Marc também se estabacou e tambem correu com a moto reserva
5) Bagnaia, que estava se sentindo ótimo na primeira largada, não se entendeu com os novos pneus que usou na segunda
6) Quartararo ficou pelo caminho
Sim, só vence quem chega ao fim de todas as voltas, mas eu não espero que a Aprilia esteja frequentando os pódios “em condições normais de temperatura e pressão” nas próximas corridas.
Zarco brilhou pela segunda corrida seguida e está tirando o máximo da sua Honda. É triste que o seu protagonismo tenha sido ofuscado por essa discussão jurídica que bagunçou, ou tem potencial para bagunçar, o mercado de pilotos em 2026. Ao fim da corrida de Le Mans muitos apostariam que ele teria carimbado o upgrade para a HRC no lugar do Marini, sem contrato pro ano que vem. Hoje tudo ficou no limbo. Martin foi a Le Mans conversar “em off” com a direção da Honda. Na minha opinião, não foi uma postura ética. Rompimento de contratos acontecem e acontecerão. De preferência de comum acordo. Muita água ainda vai rolar embaixo dessa ponte. Veremos.
Quanto ao fato de ter havido duas largadas… é o regulamento. Justo ou injusto, todas as equipes concordaram: bandeira vermelha até a 3a volta ANULA tudo o que aconteceu. Quem tiver equipamento e condições físicas alinha na posição original e começa tudo do zero. Os Marquez e o Morbidelli deram sorte. Estavam fora da briga e chegaram em 3°, 4° e 5°, colhendo pontos importantes pro campeonato.
Largar com pneu médio na frente com uma temperatura 6°C abaixo da véspera e fortes rajadas de vento foi uma decisão equivocada, mas o próprio Piero Taramassa, responsável pelos pneus Michelin, dizia preocupado no grid que ninguém tinha feito 19 voltas no pneu macio. Foi uma aposta com visíveis ganhadores e perdedores. Como o Morbidelli disse ao final da corrida: “foi violenta como um filme do Tarantino”.
Mesmo estando em último lugar entre os Construtores, acho que a Yamaha sai de Silverstone com um certo otimismo. Pela primeira vez em muitos anos colocou 3 motos direto no Q2, fez a pole, chegou a ter a 1a e a 2a posições, liderou mais da metade da corrida e perdeu por uma bobagem.
Percebe-se também uma melhoria na Honda, que até a volta 15 tinha 3 motos no Top9, ou seja, todas elas, porque o Chantra chega a andar 4 segundos mais lento que os outros: é um desperdício de uma boa moto.
As KTM só contam com Acosta e Viñales, mas este último mal apareceu, largando muito atrás porque quando saiu para dar a sua 2a volta rápida no Q1 a corrente se partiu… é de desanimar qualquer santo, coisa que o Maverick definitivamente não é. Nenhuma KTM participou do Q2 e largar em 14°, 17°, 18° e 19° dificulta um bom resultado. Por isso há que se aplaudir o 6° lugar do Tubarão (8° no sábado).
Vou me eximir de falar sobre o Bagnaia, pois neste momento ele precisa de ajuda terapêutica.
Poder-se-ia dizer que a Ducati foi a grande perdedora do fim de semana. De fato, quase que tivemos um pódio sem uma moto de Bologna pela primeira vez em 73 GPs. Daqui a duas semanas eles terão uma oportunidade de se redimir, mas continuam mais líderes do que nunca em todos os campeonatos.
MOTO2
Foi a melhor corrida do ano, com disputa na liderança até a última curva. Nosso Diogo Moreira esteve muito bem, chegou a liderar, e nunca deixou o bloco dos 5 líderes. No entanto, é visível sua perda de desempenho nas últimas voltas das corridas. Algo que ele vai investigar junto à equipe. Ao fim, tínhamos Canet e Alonso (que pegou o jeito da Moto2) disputando a vitória, seguidos pelo Senna Agius, Moreira e Guevara. Os dois primeiros se embolaram na penúltima curva e o australiano e o brasileiro passaram, com o colombiano em 3°. Acho que foi a primeira vez em muito muito tempo que não tinha nenhuma bandeira europeia no pódio.
MOTO3
Outra prova típica, com dezenas de trocas de líderes. Rueda, que saiu um último, venceu a 5a corrida no ano. Foi o 3° piloto a fazê-lo na Moto3, repetindo o feito de Binder e David Alonso. Acosta também venceu de forma ainda mais difícil, largando dos boxes.
O rookie Max Quiles chegou em 2° na sua terceira corrida. Ele é o substituto do David Alonso, o que prova que o Jorge Martinez tem um olho clínico para descobrir campeões, como o Arenas, o Guevara e o próprio Alonso. Em 2025 o Rueda vai levar, mas olho no Quiles em 2026.
Agora, Aragón.
Já tivemos muitas provas com mau tempo, então torço para um fim de semana de sol e sem quedas.
Até lá!